O desporto: méritos e pecados

Artigo de opinião de Guilherme Aguiar, vereador de Desporto e Dinamização desportiva de Vila Nova de Gaia e presidente do Grupo Temático de Desporto do Eixo.
O desporto é uma das poucas atividades sociais, com duas vertentes completamente distintas: o desporto recreação ou de lazer, criando hábitos de saúde e bem estar, individual ou coletivamente, e o desporto de competição, do amador ao profissional ou alto rendimento.
Desde há muitos milénios que o desporto, na vertente competitiva, serviu para demonstrar as qualidades e, sobretudo, as superioridades dos povos. São inúmeros os exemplos, mas recordar-se-á, apenas, os Jogos Olímpicos que na antiga Grécia eram duramente disputados pelas diversas cidades da região em busca da famosa “coroa de louros” e os Jogos do Império Romano, mais violentos mas não menos competitivos e onde sobressaía a corrida das bigas, carros de guerra de 2 rodas, puxados por 2 cavalos.
Já na Época Moderna, por influência direta do Barão Pierre de Coubertin, recriaram-se os primeiros Jogos da época moderna, que tiveram lugar em Atenas, no ano de 1896 e que, com periocidade quadrienal, se tornaram, até ao presente, no mais importante evento desportivo mundial.
Também aqui, sobretudo após o final da 2ª Guerra Mundial, os Jogos Olímpicos têm servido para os países neles participantes procurarem demonstrar a sua superioridade e poder, muitas vezes fazendo orelhas moucas e ignorando totalmente os princípios da ética desportiva e do fair-play.
Mesmo em idades mais jovens, com são as dos atletas que participam nos Jogos do Eixo Atlântico, as cidades neles participantes tudo fazem para conquistar as vitórias que lhes confiram notoriedade no território do Noroeste Peninsular. E é exatamente para evitar os excessos que tais ambições poderão atingir que, numa decisão muito acertada dos então Comissão Delegada / Comissão Técnica/ Secretário Geral, o troféu mais importante dos Jogos é o do Jogo Limpo, entregue com grande pompa na cerimónia de abertura dos Jogos seguintes.
Mas, mesmo com todos os desvios que o desporto possa apresentar, que ninguém tenha quaisquer dúvidas que aqueles são completamente ultrapassados e “esmagados” pelas imensas virtudes resultantes da prática desportiva, seja a de lazer ou recreação seja a de competição ou alto rendimento.
Desde logo, a atividade física resultante da prática desportiva traz inúmeros benefícios na saúde física e mental do praticante, combatendo alguns males modernos como o stress e a obesidade, para além de proporcionar um crescimento e desenvolvimento físico sustentado e progressivo, desenvolvendo significativamente a sua inteligência reflexiva e ajudando a tomar rápidas decisões sobre os obstáculos que se lhe vão apresentando.
Depois, porque a competição desportiva ensina os valores do fair play, o respeito pelo adversário, que não é inimigo, o espírito de luta pela vitória, a atitude perante a vitória ou a derrota, enfim, a construção de um carácter forte e ambicioso, mas com princípios éticos que não se aprendem em qualquer outra atividade.
Daí que eu sempre declare que “o desporto é uma escola de vida”. De vida saudável, de vida comunitária. De escola de princípios éticos, de escola de comportamentos: mesmo nas modalidades individuais, o praticante trabalha sempre em equipa, o treinador, o médico, o fisioterapeuta e vive, na maioria dos casos, numa meio coletivo com outros atletas da mesma ou até diferente modalidade. São os casos dos Centros de Alto Rendimento ou Treinamento, onde o espírito de grupo é elemento preponderante e decisivo no rendimento e concentração competitiva.
Nas modalidades coletivas, tais estados de espírito são potenciados ao máximo, com consequências de aumento de competitividade e espírito de coesão. Numa equipa, as eventuais fraquezas momentâneas ou permanentes de um elemento são imediatamente compensadas pelo espírito de grupo.
Mas mesmo em situações externas às equipas ou grupos, este espírito de coesão mantem-se e potencia-se. Numa competição coletiva, como os Jogos de Eixo Atlântico, só o facto das diversas equipas que integram as delegações das cidades participantes estarem alojadas conjuntamente, tomarem juntas as respetivas refeições, deslocarem-se para os equipamentos desportivos e, não menos importante, competirem entre si, cria um espírito de união e coesão com importantes repercussões no futuro. Estes jovens desportistas, provenientes das mais diversas cidades galegas e do norte de Portugal, sentem, durante um ainda que pequeno período, um sentimento comum que os diferencia de todos os demais: foram os escolhidos para, em nome das respetivas comunidades, as representarem e as defenderem no evento desportivo mais importante do Eixo-Atlântico, “ uma associação transfronteiriço de municípios, motores de desenvolvimento no espaço regional em que se inserem, caracterizado por determinadas realidades socioeconómicas e culturais similares.” E que melhor forma de conhecimento e base de união que um grande evento desportivo?
É por estarem plenamente conscientes da potencialidade do desporto no reforço da coesão social, aliado a um mais saudável crescimento físico e mental dos jovens, antecâmara de uma crescente consciência social e cidadania, que este corporiza e desenvolve, que todos os municípios, sem excepção, encaram a prática desportiva, em todas as suas vertentes, como um dos seus principais objetivos sociais, merecedores de todos os apoios. Por tais motivos, o triangulo família, escola, clube é cimentado permanentemente com toda uma série de infraestruturas específicas para a prática desportiva, piscinas, pavilhões, campos de jogos, pistas de atletismo, por eles construídos, geridos e mantidos.
Na verdade, foram os municípios, portugueses e galegos, quem há mais de 30 anos constituem o grande, senão único, suporte do fomento desportivo e elo de ligação entre as escolas e os clubes, imprescindíveis na área competitiva, ao construírem, sem qualquer ajuda exterior, salvo as comparticipações dos fundos europeus, toda a rede de infraestruturas desportivas. E isso foi visível nas últimas edições dos Jogos do Eixo-Atlântico, disputados integralmente em complexos desportivos municipais.
Para além disso, os municípios ainda custeiam as inscrições dos jovens praticantes nas respetivas associações de modalidade, isentam de pagamento a utilização pelos clubes das instalações desportivas e, muitas vezes, substituem-se ao poder central no apoio generalizado à prática dos clubes, já que os Contratos Programa celebrados entre o Governo e as Federações nacionais ´quase exclusivamente direcionado para as selecções nacionais, quando não os custos administrativos federativos, remunerações aos dirigentes incluídos.
Mas, como afirmei logo à partida, os méritos e as vantagens do Desporto superam quase totalmente alguns desvios éticos. Mente sã em corpo são, como dizem os antigos, continua a ser a conclusão resultante de 2 premissas. Desporto e Juventude.